Prestes a completar 73 anos, Pascoal Pereira da Silva, hoje aposentado pela Embasa, tem duas graduações, em gestão ambiental e gestão de saneamento, além de duas pós-graduações, em auditoria e gestão de recursos hídricos. Pelo enunciado pode-se deduzir que a aposentadoria é a coroação de uma carreira de sucesso. Mas não é bem assim.
A formação acadêmica veio já nos últimos anos de trabalho na Empresa Baiana de Saneamento. Das pouco menos de cinco décadas dedicadas à empresa, quase a metade ele passou no serviço pesado. O ensino médio permitiu galgar novas posições, mas muito longe dos postos que poderia ocupar com os diplomas atuais.
“Acredito que poderia ter chegado a uma gerência, mas por falta de estudo não pude chegar”, avalia seu Pascoal. Mas não lamenta. Para ele, o estudo tardio abriu um mundo novo de conhecimento. De quebra, ajudou a incentivar os filhos a seguir o mesmo caminho. Os seis concluíram o ensino médio e quatro têm diplomas universitários.
Seu Pascoal furou a bolha, inaugurou tradição de educação na família e hoje já inspira os 10 netos. Como Noel, de 8 anos, que pretende ser “igual ao avô”. Pelo menos com relação ao estudo. A infância, todos esperam que seja menos sofrida.
Superação
Pascoal nasceu em 25 de março de 1951, na cidade de Boa Nova. Desde os 9 anos trabalhava na roça, “roçando manga, fazendo cerca”. Aos 20 anos, a família se mudou para Cândido Sales, onde começou a trabalhar na lavoura. Em 1972, já casado com D. Zélia, sua companheira há mais de 50 anos, foi para São Paulo, como tantos retirantes, em busca de vida melhor.
Trabalhou numa metalúrgica por dois anos e, na volta, foi morar em Vitória da Conquista, onde se encontra até hoje. Entrou na Embasa como ajudante, trabalhava com picareta, cavando valetas. Concurso? Nessa época a seleção era mais subjetiva. “O teste era botar pra trabalhar o dia todo, no fim do dia o encarregado aprovava ou não”, lembra Pascoal.
A infância na fazenda não permitiu a Pascoal cursar uma escola. Não havia escola na zona rural, “nem rádio pegava”, e a distância da cidade inviabilizava o transporte. Já adulto, ele cursou o ensino fundamental em escola pública e, mais tarde, concluiu o ensino médio, aos 43 anos, em 1994, na mesma turma do filho mais velho, Dirceu, hoje Policial Militar concursado.
Além do exemplo, seguido pelos outros filhos, o ensino fundamental permitiu que Pascoal, depois de 22 anos de serviço pesado, deixasse o trabalho de campo para atuar como apontador. Animado, ele começou a cursar pré-vestibulares e por 8 vezes teve o sonho da faculdade adiado.
Em 2016, por indicação de um ex-professor do segundo grau, ingressou na graduação em gestão ambiental no formato de educação à distância da Uninter, em Vitória da Conquista. E não parou mais. Vieram a pós em auditoria (2020), pós em gestão de recursos hídricos (2022) e, em janeiro deste ano, a 2ª graduação, em gestão de saneamento. Todos os cursos ligados à empresa onde trabalhou por quase 50 anos. Conhecimento que ele não pode colocar em prática.
Em 2021, durante a pandemia, Pascoal, então com 70 anos e já aposentado, foi desligado da Embasa por fazer parte do grupo de risco. Com quatro diplomas, ele nem pensa em parar de estudar. “Como não tive como estudar quando era novo, quero estudar enquanto puder”, diz o aposentado.
A filha Zeninha é testemunha dessa determinação. “Ele sempre nos incentivou a estudar, que com estudo a gente romperia, nunca estudamos em escola particular”, orgulha-se a servidora da Prefeitura de Conquista, aprovada em concurso de 1999, após ter a inscrição realizada pelo pai. Com pós em gestão pública e administração, ela tenta acompanhar os passos de Pascoal. “Como meu pai continua estudando e eu paro?”
Autor: Alan Rodrigues / ATarde
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